Os rituais do costume não enganam: está em preparação a enésima “cimeira decisiva” para a zona euro, desta vez agendada para 9 de Dezembro.

Já todos vimos e revimos este filme dramático. A última exibição teve até honras de festival, em Cannes, embora já poucos se lembrem da forma como acabou. Mas acabou como têm acabado sempre estas cimeiras: com uma conferência de imprensa. Pouco mais.

O problema é que, à medida que o tempo passa, o fogo alastra e a terra vai ficando irremediavelmente queimada. A um ponto que já não permite a ninguém, nem mesmo à Chanceler Merkel, negar a evidência da natureza sistémica desta crise. Talvez tarde demais: a verdade é que o cenário trágico de colapso do euro deixou de ser uma hipótese pessimista. Todos os indicadores o confirmam. Assustadoramente.

Que fazer, então? Estando a casa a arder, uma ideia possível seria, talvez, começar por apagar o fogo. Mesmo. E apagar o fogo significa aqui uma única coisa: garantir o financiamento das dívidas soberanas na zona euro, libertando os Estados-membros - todos os Estados-membros, da periferia e do centro, do Norte e do Sul - das consequências da perseguição especulativa que se instalou nos mercados financeiros e que está pura e simplesmente a parasitar a falha sistémica da zona euro. Com três letrinhas apenas se escreve a solução: BCE. Já muitos o perceberam e é pena que o primeiro-ministro português teime em ficar do lado errado, na companhia errada.

Há mais para fazer? Certamente. Na governação económica, nas garantias de disciplina orçamental, na correcção das disfunções do sistema do euro. Mas não adianta persistir no erro: a ideia de que se trava esta crise das dívidas soberanas oferecendo aos mercados pacotes sucessivos de austeridade, punitivos da alegada "indisciplina orçamental" em cada vez mais países do euro e provocando uma recessão generalizada na Europa é uma ideia que se provou falsa: não apaga fogo nenhum e é apenas mais lenha para a fogueira do euro. Do mesmo modo, intervenções limitadas e intermitentes do BCE, mesmo que significativas, não são solução duradoura. Podem comprar algum tempo mas essa compra é cara: não é um bom negócio, nem resolve o problema.

Sendo assim, seria de esperar que esta "cimeira decisiva" fosse antecedida da preparação de respostas efectivas e corajosas, dirigidas ao coração da crise sistémica que a zona euro enfrenta. O Comissário Olli Rehn assegura que a Europa tem pela frente um período crítico de dez dias. Rumores na Alemanha e em Bruxelas anunciam novos planos, novas medidas. Há mesmo quem diga, como já disse tantas vezes, que "agora é que é".

Mas o facto é este: esta semana os ministros das Finanças do Eurogrupo estiveram reunidos para tomar decisões e falharam justamente onde não podiam falhar: no acordo sobre o reforço do Fundo Europeu de Estabilização Financeira. Mau sinal? Pior que isso: assim não vamos lá.

 

Artigo publicado no Diário Económico