Já ninguém duvida que a atual pandemia do Coronavírus, forçando uma simultânea travagem às quatro rodas de praticamente todas as economias do Mundo, vai provocar, inevitavelmente, uma séria recessão. Naturalmente, a prioridade é adotar as medidas de emergência que assegurem, na medida do possível, a melhor capacidade de resposta dos serviços de saúde, a manutenção das condições de funcionamento e das cadeias de abastecimento dos serviços essenciais e o apoio económico-social necessário para a sobrevivência das empresas, a proteção do emprego e a sustentabilidade da vida das famílias. A seu tempo, será também indispensável desenvolver, à escala europeia, um vasto programa de investimento que permita relançar a economia. Tudo isso, porém, custa dinheiro - muito dinheiro - e implicará, inevitavelmente, um novo ciclo de aumento dos défices e da dívida pública.

Conscientes disso, ao mesmo tempo que o BCE anunciava um novo programa de política monetária expansionista, as instituições europeias suspenderam as apertadas regras orçamentais que regem a zona euro e abriram caminho para a utilização de linhas de financiamento cautelar asseguradas pelo Mecanismo Europeu de Estabilidade, a conceder por via de empréstimos sujeitos a condicionalidade. Pretendem convencer-nos de que assim os Estados-membros são livres de gastar o que for necessário para responder à emergência - mas já vimos este filme e sabemos como acaba.

Se nada for feito, o aumento dos défices e da dívida pública, ainda que tolerado ou até estimulado, acabará, mais tarde ou mais cedo, por provocar o pânico nos mercados de dívida soberana e a diferenciação do risco entre os diversos Estados europeus, penalizando as economias mais vulneráveis e forçando um novo ciclo desastroso de políticas de austeridade. Só há uma forma de o evitar: criar, com caracter de urgência, os chamados “eurobonds” ou outros mecanismos de mutualização da dívida pública que já deviam existir há muito tempo na zona euro. Foi isso que o Primeiro-Ministro português percebeu e, com sentido de oportunidade, propôs esta semana, em conjunto com outros líderes europeus. Sem dúvida, os “eurobonds” devem constar da lista das medidas de emergência a adotar em resposta a esta crise. E é preciso vencer as resistências a esta proposta antes que seja tarde.


(Versão alongada do artigo publicado na Newsletter "PS na Europa - InfoEuropa" de 27/03/2020 - )