Os dados divulgados esta semana pelo INE provam que o apregoado "sucesso do ajustamento" não passa afinal de uma perigosa fantasia: a economia portuguesa entrou de novo numa trajectória de recessão, caindo 0,7% no 1º trimestre deste ano face ao trimestre anterior.

Resumindo: a propaganda governamental foi atropelada pela realidade e teve morte imediata.

O recuo da economia portuguesa no primeiro trimestre deste ano é decepcionante e ainda mais por ocorrer em contra ciclo, já que neste mesmo trimestre a economia da União Europeia apresentou, em termos médios, um crescimento de 0,3%. O pior, todavia, é que a explicação do INE para este mau resultado da economia portuguesa desmente toda a narrativa em que o Governo pretendia fazer assentar a sua fantástica teoria do "milagre económico". De facto, feitas as contas, o que o INE diz, preto no branco, é que "A procura externa líquida apresentou um contributo negativo expressivo (...), devido principalmente ao abrandamento das Exportações de Bens e Serviços, tendo as importações de Bens e Serviços acelerado".

Perante isto, duas conclusões se impõem e ambas desautorizam a propaganda governamental. Em primeiro lugar, o abrandamento significativo das exportações (fortemente determinado, como é sabido, pela diminuição conjuntural do contributo da produção da refinaria da GALP em Sines, um projecto lançado e apoiado ainda durante os governos socialistas) prova que, ao contrário do que diz o Governo, não ocorreu nestes últimos três anos nenhuma modificação estrutural da economia portuguesa que permita sustentar duradouramente o crescimento das exportações. Em segundo lugar, bastou a coincidência de um abrandamento conjuntural das exportações com um ligeiro crescimento da procura interna para reduzir a pó a propalada joia da coroa do programa de ajustamento - o equilíbrio na balança com o exterior - e dar lugar a um "contributo negativo expressivo" da procura externa líquida.

Trajectória recessiva, abrandamento das exportações, procura externa líquida negativa - todos estes dados gritam a mesma coisa: o sucesso de que fala o Governo está em rota de colisão frontal com a realidade da vida da economia, com a realidade da vida das empresas e com a realidade da vida das famílias e das pessoas. É, aliás, nesse mundo real que, segundo dados revelados também esta semana pelo INE, os portugueses, contra tudo o que lhes foi prometido, tiveram de suportar em 2013 um aumento brutal da receita do IRS de 34,3% (!) contribuindo assim para o recorde absoluto da carga fiscal em Portugal, que atingiu os 34,9% do PIB.

É por essas e por outras que se tornam absolutamente grotescas tantas celebrações festivas e todo este frenesim que para aí vai de conselhos de ministros extraordinários. Não creio que nada disso possa sobrepor-se ao conhecimento que os portugueses têm da situação do seu país e à consciência do que será o seu futuro se nada mudar. Eles sabem, melhor do que ninguém, que o sucesso de que fala a propaganda do Governo tem pés de barro.

 

Artigo publicado no Diário Económico